O ano era 1985, o mês, setembro, a uma corrida do tão sonhado título - que viria em Brands Hatch, antepenúltima etapa do campeonato - Alain Prost finalmente triunfaria na Fórmula 1, após duas decepcionantes derrotas (uma para Piquet em 1983 e outra para Lauda em 1984), Niki Lauda aposentaria, Nélson Piquet se transferiria para a Williams para novamente brigar por títulos, Keke Rosberg substituiria Lauda na Mclaren e mediria força com Prost - mal sabia a surra que tomaria, pobre coitado - e Ayrton Senna ficaria incumbido de liderar o audacioso projeto de trazer a Lotus de volta à briga por títulos... E é justamente aqui que começa nossa história de hoje, mas antes de começar a narrá-la, adicionemos um importante fato anunciado em setembro também: após anos de tentativas frustradas de conquistar títulos, a Renault (foto 2) resolve abandonar a Fórmula 1.
Com a saída da Renault, uma grande promessa inglesa fica sem cockpit para o ano seguinte, Derek Warwick. Carente de ídolos na Fórmula 1 - Mansell ainda não havia desabrochado seu enorme talento - e acreditando muito no potencial de Warwick, a imprensa inglesa inicia um forte lobby para que a também inglesa equipe Lotus contrate Warwick para o lugar do recém demitido Elio de Angelis, de malas prontas para substituir Nélson Piquet na Brabham. Peter Warr, chefe de equipe da Lotus, começou a ser fortemente pressionado pelos veículos de imprensa ingleses e estava inclinado a ceder à essa pressão favorável à contratação do jovem promissor inglês, mas esbarrou num obstáculo gigante: Ayrton Senna. Senna vetou taxativamente a idéia de ter Derek Warwick como seu companheiro de equipe, fato que desencadeou uma profunda ira dos ingleses contra a estrela emergente brasileira. À partir do veto de Senna, a imprensa inglesa intensificou o bombardeio contra Warr alegando que se ele cedesse à recusa do brasileiro, perderia totalmente o controle sobre sua equipe. Warr tentou então demover Senna de sua decisão e a resposta do brasileiro surgiu através da seguinte declaração:
"O caso é bem simples. Compreendo perfeitamente o problema. Quando o Warwick ficou sem carro, entendi que ele merecia que lhe dessem uma força, mas a Lotus tem um contrato comigo desde um ano antes, em que é claro que em 1986 as atenções têm que estar focadas em mim. O problema não é o Warwick, mas o cumprimento de um acordo. Se entrasse um piloto de primeira linha para a equipe, qualquer que fosse, de que forma a Lotus poderia cumprir o contrato comigo, se estava violando o espírito desse acordo? Efetivamente, coloco a hipótese da minha saída se isso acontecer, pois representaria quebra de acordo por parte da Lotus."
Saia justa total para Peter Warr, que entre ficar com Senna ou Warwick, obviamente optou pelo brasileiro, o que acarretou a declaração de uma verdadeira GUERRA contra Senna na Inglaterra, onde o brasileiro era atacado com uma avalanche de piadas sarcásticas que o taxavam de covarde, o clima de galhofa era tal que chegaram a sugerir à Lotus que mudasse seu nome oficial para JOHN PLAYER SPECIAL TEAM... SENNA. A imprensa brasileira, talvez no intuito de blindar Senna contra uma possível mancha na imagem do novo ídolo nacional, pouco noticiou o fato. Mas eu, no auge de minha pré-adolescência - tinha doze anos na época - e estudando inglês vorazmente, devorava periódicos e revistas ingleses e posso dizer com toda propriedade que a polêmica gerada na terra da Rainha foi maior até que o recente escândalo Stepneygate, para efeito de comparação.
Duvidam ??? Então, leiam duas declarações sobre o caso, a primeira de Peter Warr (na foto abaixo à esquerda, junto com Elio de Angelis):
"Na equipe quem MANDA SOU EU, mas é evidente que todas as decisões importantes são tomadas depois que Ayrton Senna dê sua opinião"
A segunda declaração, mais incisiva ainda, é do próprio Warwick (foto abaixo), que 18 anos depois do imbróglio ainda deixa claro seu ressentimento:
"Eu acho que Senna foi provavelmente o melhor piloto que já existiu, mas ele provavelmente ARRUINOU minha carreira. Ele tinha convicção de que a Lotus não podia ter dois pilotos de primeira linha, mas também sabia que eu era uma ameaça tanto dentro quanto fora das pistas, e talvez tivesse até uma condução superior. De uma coisa eu tenho certeza, adoraria ter sido companheiro de equipe de Ayrton para ver o quão bom eu poderia ter sido e lembrem-se que nenhum dos meus companheiros conseguiram ser tão bons ou rápidos quanto eu fui".
De nada adiantou a chiadeira inglesa, a Lotus acabou contratatando um piloto medíocre, o conde Johnny Dumfries (foto abaixo), para fazer mera figuração em 1986 e Warwick acabou ficanco a pé. Ironicamente, Warwick substituiria Elio de Angelis - a quem ele queria tanto suceder na Lotus - a partir do GP do Canadá (sexta corrida de dezesseis do certame) na Brabham-BMW devido ao falecimento do italiano numa sessão de testes em Paul Ricard, no dia 15 de maio. E a Lotus liderada por Senna, conseguiria duas parcas vitórias no campeonato, um modesto quarto lugar no mundial de pilotos e a terceira colocação no mundial de construtores, com o Conde Dumfries colaborando somente com 3 míseros pontos para a campanha da equipe inglesa.