sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009

Um veto e suas consequências

O ano era 1985, o mês, setembro, a uma corrida do tão sonhado título - que viria em Brands Hatch, antepenúltima etapa do campeonato - Alain Prost finalmente triunfaria na Fórmula 1, após duas decepcionantes derrotas (uma para Piquet em 1983 e outra para Lauda em 1984), Niki Lauda aposentaria, Nélson Piquet se transferiria para a Williams para novamente brigar por títulos, Keke Rosberg substituiria Lauda na Mclaren e mediria força com Prost - mal sabia a surra que tomaria, pobre coitado - e Ayrton Senna ficaria incumbido de liderar o audacioso projeto de trazer a Lotus de volta à briga por títulos... E é justamente aqui que começa nossa história de hoje, mas antes de começar a narrá-la, adicionemos um importante fato anunciado em setembro também: após anos de tentativas frustradas de conquistar títulos, a Renault (foto 2) resolve abandonar a Fórmula 1.

Com a saída da Renault, uma grande promessa inglesa fica sem cockpit para o ano seguinte, Derek Warwick. Carente de ídolos na Fórmula 1 - Mansell ainda não havia desabrochado seu enorme talento - e acreditando muito no potencial de Warwick, a imprensa inglesa inicia um forte lobby para que a também inglesa equipe Lotus contrate Warwick para o lugar do recém demitido Elio de Angelis, de malas prontas para substituir Nélson Piquet na Brabham. Peter Warr, chefe de equipe da Lotus, começou a ser fortemente pressionado pelos veículos de imprensa ingleses e estava inclinado a ceder à essa pressão favorável à contratação do jovem promissor inglês, mas esbarrou num obstáculo gigante: Ayrton Senna. Senna vetou taxativamente a idéia de ter Derek Warwick como seu companheiro de equipe, fato que desencadeou uma profunda ira dos ingleses contra a estrela emergente brasileira. À partir do veto de Senna, a imprensa inglesa intensificou o bombardeio contra Warr alegando que se ele cedesse à recusa do brasileiro, perderia totalmente o controle sobre sua equipe. Warr tentou então demover Senna de sua decisão e a resposta do brasileiro surgiu através da seguinte declaração:

"O caso é bem simples. Compreendo perfeitamente o problema. Quando o Warwick ficou sem carro, entendi que ele merecia que lhe dessem uma força, mas a Lotus tem um contrato comigo desde um ano antes, em que é claro que em 1986 as atenções têm que estar focadas em mim. O problema não é o Warwick, mas o cumprimento de um acordo. Se entrasse um piloto de primeira linha para a equipe, qualquer que fosse, de que forma a Lotus poderia cumprir o contrato comigo, se estava violando o espírito desse acordo? Efetivamente, coloco a hipótese da minha saída se isso acontecer, pois representaria quebra de acordo por parte da Lotus."


Trocando em miúdos: OU ELE OU EU !!!


Saia justa total para Peter Warr, que entre ficar com Senna ou Warwick, obviamente optou pelo brasileiro, o que acarretou a declaração de uma verdadeira GUERRA contra Senna na Inglaterra, onde o brasileiro era atacado com uma avalanche de piadas sarcásticas que o taxavam de covarde, o clima de galhofa era tal que chegaram a sugerir à Lotus que mudasse seu nome oficial para JOHN PLAYER SPECIAL TEAM... SENNA. A imprensa brasileira, talvez no intuito de blindar Senna contra uma possível mancha na imagem do novo ídolo nacional, pouco noticiou o fato. Mas eu, no auge de minha pré-adolescência - tinha doze anos na época - e estudando inglês vorazmente, devorava periódicos e revistas ingleses e posso dizer com toda propriedade que a polêmica gerada na terra da Rainha foi maior até que o recente escândalo Stepneygate, para efeito de comparação.
Duvidam ??? Então, leiam duas declarações sobre o caso, a primeira de Peter Warr (na foto abaixo à esquerda, junto com Elio de Angelis):

"Na equipe quem MANDA SOU EU, mas é evidente que todas as decisões importantes são tomadas depois que Ayrton Senna dê sua opinião"


A segunda declaração, mais incisiva ainda, é do próprio Warwick (foto abaixo), que 18 anos depois do imbróglio ainda deixa claro seu ressentimento:

"Eu acho que Senna foi provavelmente o melhor piloto que já existiu, mas ele provavelmente ARRUINOU minha carreira. Ele tinha convicção de que a Lotus não podia ter dois pilotos de primeira linha, mas também sabia que eu era uma ameaça tanto dentro quanto fora das pistas, e talvez tivesse até uma condução superior. De uma coisa eu tenho certeza, adoraria ter sido companheiro de equipe de Ayrton para ver o quão bom eu poderia ter sido e lembrem-se que nenhum dos meus companheiros conseguiram ser tão bons ou rápidos quanto eu fui".

De nada adiantou a chiadeira inglesa, a Lotus acabou contratatando um piloto medíocre, o conde Johnny Dumfries (foto abaixo), para fazer mera figuração em 1986 e Warwick acabou ficanco a pé. Ironicamente, Warwick substituiria Elio de Angelis - a quem ele queria tanto suceder na Lotus - a partir do GP do Canadá (sexta corrida de dezesseis do certame) na Brabham-BMW devido ao falecimento do italiano numa sessão de testes em Paul Ricard, no dia 15 de maio. E a Lotus liderada por Senna, conseguiria duas parcas vitórias no campeonato, um modesto quarto lugar no mundial de pilotos e a terceira colocação no mundial de construtores, com o Conde Dumfries colaborando somente com 3 míseros pontos para a campanha da equipe inglesa.


A Derek Warwick NUNCA seria dada a chance de guiar um carro de ponta.