Mark Webber, escudeiro-mor da atual modorrenta e enfadonha
Fórmula 1 aposenta seus préstimos neste final de semana em Interlagos e deu a
seguinte declaração sobre a chata categoria:
"Eu
não sairia se não houvesse coisas que estou feliz de deixar para trás. Se houvesse
mais pontos positivos do que negativos, então obviamente eu
ficaria. Há mais pontos negativos do que positivos".
Confesso que esta foi a única notícia que me chamou a
atenção sobre Fórmula 1 nestes últimos meses. Desde, sei lá, a oitava ou nona
corrida não sei dar notícia alguma sobre as corridas, quem ganhou , quem
perdeu, quem isso ou quem aquilo... E isso seria impensável para um outrora fã
incondicional da categoria. Tão fã que de 1981 a 2012 deixei de
assistir apenas o GP do México de 1986 por culpa de um incidente de viagem.
Quais seriam então os motivos para uma mudança tão radical
de postura? Aproveito a oportuna declaração de Webber para enumerar através de
pontos negativos os motivos:
1 – A Fórmula 1 tornou-se refém de sua estrutura
antidesportiva:
A dupla Ferrari-Schumacher institucionalizou na F-1 moderna
a obrigatoriedade da hierarquia de pilotos, onde o piloto principal tem total
prioridade sob todos os aspectos em uma disputa. Surgiu assim a figura do
piloto-escudeiro, que tem basear toda sua estratégia de corrida, desde o início
da temporada, visando o benefício do primeiro piloto, que é o único liberado
para realmente lutar por vitórias e títulos. Esta situação criou vários
episódios grotescos, tais como: o GP da Áustria de 2002, onde Rubens Barrichello
foi obrigado a dar passagem para Schumacher e ambos foram vaiados
ostensivamente pelo público presente no autódromo; o GP da Alemanha de 2010, onde Felipe Massa recebeu a famosa ordem “Alonso is faster than you” e teve que
dar a vitória de bandeja para o espanhol; e, o pior de todos, o GP de Cingapura de
2008, quando Nelsinho Piquet foi forçado a forjar um acidente para que entrasse
o safety car beneficiando Fernando Alonso que liderava em um momento de pit
stops sucessivos...
A FIA até tentou criar leis que coibissem as famigeradas
“ordens de box”, mas diante da total impossibilidade em aplicá-las, pois as equipes facilmente as driblavam, acabou cedendo a dura realidade estrutural da
atual F-1: as equipes determinam o resultado final de uma corrida de acordo com
seus interesses pessoais.
Quem em sã consciência está disposto a assistir ou até mesmo
torcer para um esporte-“marmelada” ???
2 - Grids esvaziados:
Como é triste ver um grid de F-1 com apenas 18 carros, são
muitos pilotos de talento esperando uma vaga na F-1 com tão poucos assentos
disponíveis. Alguém poderia argumentar que estou louco por causa do número
supracitado, pois a F-1 tem 22 carros, mas, falando sério, a Marussia e a
Caterham são carros de F-1 ???
Sou do tempo em que o grid contava com 26 carros, uns
24 de verdade e uns 2 ruins, mas nenhum deles tão ruim que não almejava
absolutamente nada como Marussia e Caterham.
3 – Excesso de pilotos pagantes:
A Fórmula 1 sempre foi cara e sempre teve pilotos pagantes,
mas não tanto quanto atualmente. A conseqüência disso é que o nível dos pilotos
caiu muito, pilotos bons e capazes de gerar espetáculo são preteridos para dar
lugar a cabeças de bagre endinheirados e insossos.
4 – Declínio brutal do fator humano na decisão do resultado
final:
Já faz algum tempo que os pilotos vem influenciando cada vez
menos nos resultados finais das corridas, mas desde 2010 a tecnologia e a
aerodinâmica são as chaves principais para a vitória na F-1. A fórmula do sucesso passa
primeiro por um grande aerodinamicista, um staff competente de diretores e
engenheiros e dinheiro – muito dinheiro – para pagar a constante evolução
tecnológica que a categoria prescinde. Piloto ? Basta ter um bom piloto –
apenas bom, não sensacional ou espetacular – que seja rápido o suficiente – não
meteórico como Senna foi – para fazer pole positions e que erre pouco para
administrar bem uma estratégia vencedora. A conseqüência disso é que deixa de
existir a figura do ídolo, do herói que as crianças e jovens sonhariam em se
tornar e os marmanjos admirariam e torceriam fervorosamente.
Existem mais fatores negativos que poderiam ser enumerados,
mas destaco esses 4 supracitados porque a conjunção deles já demonstra o
motivo maior de a Fórmula 1 ter deixado de ser assunto em padarias ou
botequins, ter perdido o interesse para a esmagadora maioria das pessoas que
gostam de esporte. E é com tristeza que concluo que eu, um antigo fã
incondicional da categoria (como disse anteriormente), me sinto órfão de um dos
maiores prazeres que tinha na vida.